Combinamos a pescaria para
o mês de maio de 1992. O grupo, formado por Miguel Rotondo e Miguelzinho (pai
e filho), Wilson José Guimarães, os dois irmãos Marcos e Luís, mais Guilherme e
eu, saiu de Boa Esperança às 4 h em dois veículos, por coincidência no dia do
meu aniversário. Subindo pelo mapa afora, a partir de Boa Esperança,
percorremos mais de oitocentos quilômetros e atravessamos quase todo o Estado
de Minas Gerais, passando por Formiga, Patos de Minas, aonde almoçamos; daí a
Unaí até chegar em Arinos às 18 h. Situada na margem esquerda do rio Urucuia, a
cidade mormaçava em pleno sertão das obras de Guimarães Rosa. Era a primeira
vez que eu ia pescar tão longe de casa. Naquele momento, fui incapaz de adivinhar
que não veria mais as águas do Urucuia, importante afluente do Velho Chico.
Pelo menos até hoje não voltei — apesar de ter comprado, naquela excursão, a
quarta parte de um rancho na beira do rio, vizinho ao que ocupamos. Este foi um
investimento em uvas verdes, que jamais amadureceram, do qual me desfiz em Boa Esperança mesmo,
passado algum tempo.
Durou sete dias a pescaria,
se é que se pode chamar de pescaria uma atividade em que ninguém pescou nada
além de um animal blindado, certamente pré-histórico, colorido de um
amarelo-ocre sujo, que apelidamos de abotoado por causa das escamas em
alto-relevo na forma de botões. Os barranqueiros da região chamam esse peixe de
“gongó” ou “armau”, com este último nome querendo talvez muito acertadamente
dizer “armário”. Quantos anzóis colocássemos na linha, era o pescador premiado
com o mesmo número de abotoados embarcados. Devia ser um enorme cardume.
Parecendo mortos de fome, os blindados atacavam em bando as iscas. Morrendo de
rir de raiva, devolvíamos todos ao Urucuia, como se estivéssemos
preocupadíssimos com a preservação daquela espécie encouraçada. Estranho: os abotoados
tinham sempre o mesmo porte, um pouco mais de um quilo cada. E uma puxada de
peixe muito maior. Mas os peixes comestíveis, que trouxemos congelados, foram
pescados com anzol-de-cobre, exceto o exemplar do dourado objeto da continuação
desta crônica.
Haverá quem diga: — É
lorota de barranqueiro, mais uma estória de pescador! — Mas podem perguntar aos
meus companheiros na aventura e a todos pescadores dos afluentes do Médio São
Francisco (acho que a história já se espalhou o suficiente), que eles atestarão
sobre a veracidade das minhas palavras. Aqui, também, só vale o que está
escrito, não há mais nada a acrescentar.
(CONTINUA E TERMINA NA PRÓXIMA POSTAGEM.)
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